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domingo, 5 de julho de 2009

Não fora o mar




Não fora o mar,

e eu seria feliz na minha rua,

neste primeiro andar da minha casa

a ver, de dia, o sol, de noite a lua,

calada, quieta, sem um golpe de asa.


Não fora o mar,

e seriam contados os meus passos,

tantos para viver, para morrer,

tantos os movimentos dos meus braços,

pequena angústia, pequeno prazer.


Não fora o mar,

e os seus sonhos seriam sem violência

como irisadas bolas de sabão,

efémero cristal, branca aparência,

e o resto — pingos de água em minha mão.


Não fora o mar,

e este cruel desejo de aventura

seria vaga música ao sol pôr

nem sequer brasa viva, queimadura,

pouco mais que o perfume duma flor.


Não fora o mar

e o longo apelo, o canto da sereia,

apenas ilusão, miragem,

breve canção, passo breve na areia,

desejo balbuciante de viagem.


Não fora o mar e,

resignada, em vez de olhar os astros

tudo o que é alto, inacessível, fundo,

cimos, castelos, torres, nuvens, mastros,

iria de olhos baixos pelo mundo.


Não fora o mar

e o meu canto seria flor e mel,

asa de borboleta, rouxinol,

e não rude halali, garra cruel,

Águia Real que desafia o sol.


Não fora o mar

e este potro selvagem, sem arção,

crinas ao vento, com arreio,

meu altivo, indomável coração,


Não fora o mar

e comeria à mão,

não fora o mar

e aceitaria o freio.


Fernanda de Castro

sexta-feira, 2 de janeiro de 2009

o vermelho e o trigo...




No fundo da terra há sempre
Um húmus insuspeito, uma semente, uma promessa...

Talvez um parto...

Talvez um grito,
Ou uma dor por abrir...

Talvez uma tensão na hora de soltar-se...

Há sempre na noite
Um dia imprevisível, uma esperança calada...

Há sempre uma morte que se faz vida...

Há sempre o vermelho e o trigo...

Sabe-se lá quando pode explodir uma flor...



sábado, 13 de dezembro de 2008

Salvem os ricos




Os Contemporâneos no seu melhor!

quinta-feira, 27 de novembro de 2008

Mas que sei eu




Mas que sei eu das folhas no outono
ao vento vorazmente arremessadas
quando eu passo pelas madrugadas
tal como passaria qualquer dono?
Eu sei que é vão o vento e lento o sono
e acabam coisas mal principiadas
no ínvio precipício das geadas
que pressinto no meu fundo abandono
Nenhum súbito lamenta
a dor de assim passar que me atormenta
e me ergue no ar como outra folha
qualquer. Mas eu sei que sei destas manhãs?
As coisas vêm vão e são tão vãs
como este olhar que ignoro que me olha

Ruy Belo

domingo, 23 de novembro de 2008

Ainda o Porto...



by vida de vidro

Afinal, o Porto, para verdadeiramente honrar o nome que tem, é, primeiro que tudo, este largo regaço aberto para o rio, mas que só do rio se vê, ou então, por estreitas bocas fechadas por muretes, pode o viajante debruçar-se para o ar livre e ter a ilusão de que todo o Porto é a Ribeira.

José Saramago

terça-feira, 11 de novembro de 2008

Sino


Badaladas de choro
Grito
Repique de perfídias
Ignomínias
Nem em dias, nem em horas
Nem em quartos
É nos abalos tristes que ele bate
É quando o coração da gente soa
Num parto, numa ida, num desastre
Na perca do amigo é que ele ecoa
Repica em desalinho
Ri e chora
Nem em quartos, nem em horas,
Nem em dias, nem em meses
Repica de alegrias, de saudades
Ressoa lento pelas noites
Pelas tardes
Nem em segundos, nem em horas,
Nem em anos, nem em quartos.
É nos entre tempos que ele bate.


segunda-feira, 10 de novembro de 2008

Paula Rego - um inferno a visitar





Paula Rego, Lela playing with Gremlin



O Centro de Arte Manuel de Brito, no Palácio Anjos em Algés, expõe, até 18 Janeiro de 2009, trabalhos de Paula Rego, desde os anos 50 até à actualidade.
Paralelamente, está patente a exposição «Anos 80» que exibe obras de artistas como António Dacosta, Nadir Afonso, Júlio Pomar, Graça Morais, Menez, Nikias Skapinakis e José de Guimarães, entre outros.
A mostra funciona de terça-feira a domingo, das 11:30 às 18:30. Na última sexta-feira de cada mês as portas abrem das 11:30 às 24:00 horas.


A não perder, digo eu.

terça-feira, 28 de outubro de 2008

Poente com chama



by Vida de vidro

Inflama-me, poente: faz-me perfume e chama;
que o meu coração seja igual a ti, poente!
descobre em mim o eterno, o que arde, o que ama,
...e o vento do esquecimento arraste o que é doente!

Juan Ramón Jiménez

segunda-feira, 20 de outubro de 2008

Porque gosto...

Não consegui saber o nome. Só sei que ganhou um concurso de dança na Coreia. E gosto. Definitivamente.

sexta-feira, 10 de outubro de 2008

Olhares sobre o Algarve





... que não é apenas praia. Bom fim de semana!!

sábado, 4 de outubro de 2008

Zeitgeist

Zeitgeist é uma palavra alemã que significa espírito da época ou espírito do tempo. Baseado numa série de teorias a que podemos chamar "da conspiração", foi realizado por Peter Joseph um documentário com o mesmo nome que provavelmente já muitos viram, dada a sua larga distribuição na Internet.
Confesso que o vi hoje pela primeira vez e ainda não tenho uma opinião completamente formada. Apenas sei que, independentemente de estar ou não bem conseguido, me está a dar muita matéria para pensar. Para quem ainda não viu, deixo aqui o link do site oficial onde pode ser visto integralmente. E, se quiserem, digam o que pensam.

zeitgeistmovie.com

quarta-feira, 31 de outubro de 2007

Vou-me sentar à janela




vou-me sentar à janela
a ver a vida lá fora.
os meninos do jardim
aquela mulher que passa
o homem que vai embora.
e eu sentada aqui dentro
com um vidro de permeio
vejo os risos que não oiço
sinto os olhos da mulher
presos na pressa do homem
que se cruza no passeio.
a rua é um mar de acasos
de vidas que não se sabem.
tento eu ligar os passos
em qualquer conto inventado
visto através da vidraça.
a chuva esconde os pedaços
da vida que está lá fora
e eu sentada à janela
olhando o que sonho dela.

Novembro 2005

[Pausa. Não exactamente para me sentar à janela]

domingo, 28 de outubro de 2007

Ainda...




Ainda sabemos cantar

Ainda sabemos cantar,
só a nossa voz é que mudou:
somos agora mais lentos,
mais amargos,
e um novo gesto é igual ao que passou.

Um verso já não é a maravilha,
um corpo já não é a plenitude.

Eugénio de Andrade

sexta-feira, 26 de outubro de 2007

Tágides



Óleo de Columbano Bordalo Pinheiro

E vós, Tágides minhas, pois criado
Tendes em mi[m] um novo engenho ardente,
Se sempre em verso humilde celebrado
Foi de mi[m] vosso rio alegremente,
Dai-me agora um som alto e sublimado,
Um estilo grandíloq[u]o e corrente,
Porque de vossas águas Febo ordene
Que não tenham enveja às de Hipocrene.

Luís de Camões, in Os Lusíadas





Foto by vida de vidro, Esculturas de João Cutileiro

sexta-feira, 19 de outubro de 2007

Poema de Outono




O vento soprou
Tão doce e sereno
Tocou-me ao de leve
Girou sentimentos
Dormentes, silentes
Que em voo rasante
Tocaram o chão

O fundo da alma
Fez-se de cor de ouro
Castanho ou laranja
Deu frutos já secos
De um doce amargo
Surgiu o Outono
No meu coração.

Setembro 2004

sábado, 13 de outubro de 2007

Da ausência




Ausência II

Eu deixarei que morra em mim o desejo de amar os teus olhos que são doces
Porque nada te poderei dar senão a mágoa de me veres eternamente exausto.
No entanto a tua presença é qualquer coisa como a luz e a vida
E eu sinto que em meu gesto existe o teu gesto e em minha voz a tua voz.
Não te quero ter porque em meu ser tudo estaria terminado.
Quero só que surjas em mim como a fé nos desesperados
Para que eu possa levar uma gota de orvalho nesta terra amaldiçoada
Que ficou sobre a minha carne como nódoa do passado.
Eu deixarei... tu irás e encostarás a tua face em outra face.
Teus dedos enlaçarão outros dedos e tu desabrocharás para a madrugada.
Mas tu não saberás que quem te colheu fui eu, porque eu fui o grande íntimo da noite.
Porque eu encostei minha face na face da noite e ouvi a tua fala amorosa.
Porque meus dedos enlaçaram os dedos da névoa suspensos no espaço.
E eu trouxe até mim a misteriosa essência do teu abandono desordenado.
Eu ficarei só como os veleiros nos pontos silenciosos.
Mas eu te possuirei como ninguém porque poderei partir.
E todas as lamentações do mar, do vento, do céu, das aves, das estrelas.
Serão a tua voz presente, a tua voz ausente, a tua voz serenizada.

Vinicius de Moraes

sexta-feira, 28 de setembro de 2007

Sobre a bicicleta



Na Holanda. Naturalmente.

sexta-feira, 21 de setembro de 2007

Perfeição




Dói-me a beleza exagerada
a perfeição azul do horizonte
a doce transparência da manhã
que finda a névoa da madrugada.

Julho 2005

quinta-feira, 20 de setembro de 2007

Madonas da Flandres



Sinais de um culto enraizado. Um caminho que se percorre até ao rosto pensativo e sereno da Madona de Michelangelo.

terça-feira, 18 de setembro de 2007

Lição sobre a água



Este líquido é água.
Quando pura
é inodora, insípida e incolor.
Reduzida a vapor,
sob tensão e alta temperatura,
move os êmbolos das máquínas que, por isso,
se denominam máquinas a vapor.
É um bom dissolvente.
Embora com excepções mas de um modo geral,
dissolve tudo bem, ácidos, bases e sais.
Congela a zero graus centesimais
e ferve a 100, quando à pressão normal.
Foi neste líquido que numa noite cálida de Verão,
sob um luar gomoso e branco de camélia,
apareceu a boiar o cadáver de Ofélia
com um nenúfar na mão.

António Gedeão